Coluna publicada no jornal Estadão 22/06/20
As mãos finas e delicadas do menino de 6 anos de idade, que nasceu com fissura nos lábios, pegou o pequeno cachorro de apenas sete dias de vida e 275 gramas e aproximou ao seu rosto. Kaio Machado fechou os olhos, suspirou e disse: “ele vai chamar-se Robin”, nome do seu super herói preferido, que faz parte do Novos Titãs.
Além de serem heróis na vida real, Kaio e Robin tinham muitas coisas em comum e uma delas é o lábio fissurado. Ambos nasceram diferentes dos demais e descobriram que não há nada de errado nisso.
O exame que mudou a sua vida
A auxiliar de estamparia Karen Machado, mãe do Kaio, no quinto mês de gravidez foi fazer o tradicional exame morfológico. O médico que estava conduzindo o ultrassom parou no meio e disse: seu bebê nascerá feio, pois terá fissura labiopalatina. O mundo parecia ter desabado. O que aquilo significava? Tudo que lembra depois deste momento, foi de chorar por longas horas e sentir-se completamente perdida.
O momento da adoção
Poderia ser um dia como outro qualquer na pacata cidade de Jaguará do Sul, interior de Santa Catarina. Karen acordou, pegou o celular e abriu o Instagram. Logo viu a publicação da conta Fissurados no Amor com a foto de um cão minúsculo e o texto: ele possui o lábio leporino e precisa de cuidados especiais. Bem, ela era expert no assunto. “Durante cinco anos questionei: porque o Kaio veio para mim? Quando vi a foto do Robin, eu estava madura para dizer: ele deve ser meu e melhor amigo do Kaio”.
Robin chegou na manhã do dia 18 de abril de 2019, e durante semanas foi alimentado de três em três horas com leite especial através de uma seringa e mamadeira. Sua cama era aquecida com secador de cabelos e uma bolsa térmica cumpria o papel de mantê-lo quente. Para fazer as necessidades, Karen estimulava sua barriguinha com uma buchinha quente. Ela precisava substituir o papel da mãe biológica do cachorrinho mais fraco da ninhada, que havia sido rejeitado e não teria sobrevivido sem cuidados especiais.
Robin salvou a vida de todos
O lábio do Kaio tem fissura bilateral, do Robin uni. Kaio faz parte da estatística que mostra que a cada 650 brasileiros, um nasce assim. Desde que nasceu passou por quatro cirurgias para melhorar sua dificuldade na fala e audição. Todas subsidiadas pela ONG americana Smile Train, que faz um trabalho bárbaro de aceitação, conscientização e apoio à famílias carentes que possuem filhos com essa condição.
No caso do Robin, não há maiores consequências. A fissura dele serviu para melhorar a auto-estima do Kaio, pois o menino não estava mais só, e não atrapalha em nada as brincadeiras com a bolinha, que os dois tanto adoram. Afinal, super heróis servem para isso: salvar vidas.
#kdosorriso
24 de junho é dia da conscientização da fissura labiopalatina. E para jogar holofotes na causa e romper com o preconceito, foi lançado o movimento #kdosorisso. Nesse dia, a proposta é trocar a foto do perfil no Instagram e postar uma imagem do seu rosto com suas mãos tapando os lábios.